Udaipur & Holi Festival

07.03.2020 | Depois de viajar pelas estradas e ferrovias da Índia, chegou a hora de voar pelo país. Saímos de Mumbai, na costa oeste, e voamos para Udaipur, cerca de 750km ao norte. Udaipur foi a nossa porta de entrada no Rajastão, o maior estado da Índia. Essa é terra dos reis (ou marajás) e dos palácios. Uma região riquíssima sob o aspecto histórico e cultural, que se reflete na sua arquitetura, costumes e nas cores vibrantes. O Rajastão é a personificação do que a maioria de nós imagina quando pensa em Índia.

Chegamos em Udaipur no fim da tarde de um sábado, pegamos um Uber e fomos do aeroporto direto para o nosso hotel, Madri Haveli. De cara pudemos perceber que o centrinho da cidade era uma delícia e, pra nossa boa surpresa, nosso hotel também. 😊

Haveli é como são conhecidos os antigos casarões da Índia. Como geralmente essas construções têm muitos cômodos, vários havelis foram reformados e transformados em hotéis. Outra característica muito comum dos havelis é o terraço e, felizmente, o nosso também contava com um. Então, logo depois do check in, deixamos nossas coisas no quarto e fomos direto para lá curtir o lindo pôr do sol em Udaipur. Que recepção! Um ambiente tão agradável e um fim de tarde tão lindo que decidimos jantar ali mesmo. Vale deixar registrado que a comida do restaurante do hotel respondeu à altura do visual, então já fica a dica pra quem for a Udaipur. 😉

Para explorar a cidade e conhecer um pouco mais desse estado que é pura história, reservamos um walking tour que encontramos através do GuruWalk. O passeio começava às 10h, então aproveitamos o tempo para tomar um café da manhã bem tranquilo no terraço do nosso Haveli. Como podem notar, foi mesmo amor à primeira vista por esse pedacinho da Índia! hehe

Conforme combinado, às 10h fomos até a torre do relógio onde nos encontramos com o guia. O inglês dele não era dos melhores e, além disso, ele usava um lenço para cobrir a boca, o que dificultava ainda mais o entendimento. O uso do lenço se deve a uma tradição da religião que ele segue, o Jainismo. Essa religião é uma das mais antigas da Índia e, apesar de ter muitos aspectos em comum com o hinduísmo e até o budismo, suas origens são independentes.

Ficamos bastante curiosos sobre essa religião, que é a sexta mais representativa da Índia, com cerca de 5 milhões de seguidores, e foi muito esclarecedor ter alguém que a seguia durante o passeio. O jainismo prega que a renúncia e uma vida simples são o caminho para a libertação. Eles seguem uma dieta estritamente vegetariana e vivem de uma forma simples a fim de minimizar ao máximo o uso de recursos naturais, pois eles acreditam que os animais e as plantas também tem alma.

Assim como budistas e hinduístas, os jainistas acreditam na reencarnação e na evolução sucessiva até que se atinja o estado de libertação total em que a alma imortal vive completamente em estado de êxtase. A religião não venera nenhum deus (similar ao budismo) e o culto se dá principalmente aos tirthankaras, imagens que lembram um buda e que representam almas nascidas humanas que atingiram a libertação. O guia nos levou a dois templos jainistas, que para nós leigos muito se parecem com os templos hindus. As fotos por dentro eram restritas, então temos poucos registros.

Depois da visita ao templo jainista, caminhamos em direção às margens do Lago Pichola. O lago é artificial, e assim como outros que embelezam a região, foi formado em 1362 em decorrência da construção de uma barragem erguida afim de garantir que a água chegasse até os vilarejos locais. Com o lago, vários palácios foram construídos no decorrer dos séculos em que o reinado de Rajput dominou a região. Uma forte característica da arquitetura Rajput eram as contruções em mármore e assim, o lago foi rodeado de lindas edificações de cor clara que hoje conferem a Udaipur o apelido de White City, ou Cidade Branca. Assim como o Haveli que ficamos hospedados, atualmente a maioria dos palácios foram convertidos em hotel.

O lago também exerce uma função social na cidade. Enquanto caminhávamos ao seu redor, vimos moradores se banhando, mulheres levando roupa, sem falar nos inúmeros macacos que também gostam de ficar por ali, só curtindo o visual do lago hehehe. Também é possível fazer um passeio de barco pela tarde, que é ainda mais especial durante o pôr do sol.

A próxima parada do tour guiado foi no Jagdish Temple, umas das principais atrações da cidade. O Jagdish é um templo hindu, um lugar de adoração desde 1651. Como nossa visita ao templo foi no dia que antecedia ao Holi, o templo estava bem movimentado, com celebrações especiais.

Fim do tour, atravessamos o lago para almoçar em um restaurante que havíamos lido boas recomendações chamado Millets of Mewar. Em seguida, voltamos ao centrinho e por lá encontramos o Udai Art Cafe, um ambiente super agradável e com espresso de verdade, que estávamos sentindo falta. 😊

Já era quase 16h quando fomos até o Palácio da cidade para confirmar os horários de abertura e, por fim, fomos convencidos a já fazer a visita na hora. Além do ingresso, pagamos mais 450 rúpias (6 USD) e contratamos um guia oficial. O passeio com ele pelo palácio durou umas 2h e valeu a pena para entender a história do lugar.

O Palácio de Udaipur é o maior do Rajastão, com uma fachada de 244m de comprimento e 30m de altura. A construção foi iniciada em 1599 pelo Maharana Udai Singh II que, além de ser o fundador, dá nome à cidade; e complementado pelos vários Maharanas (reis) subsequentes. O Palácio possui uma série de ambientes decorados com pinturas e artes que recontam cenas de batalhas e celebrações locais. Uma das histórias diz respeito ao filho do Maharana Udai, chamado Maharana Pratap, e seu inseparável cavalo Chetak que por vezes utiliza uma armadura com tromba para confundir os elefantes inimigos. 😅 Pratap é tido como o maior guerreiro local por seu combate contra o Império Mogol e jamais visitou o Palácio que deveria ter sido seu. Outro local interessante é o jardim que fica no último andar do Palácio, com árvores de tamanho expressivo. Segundo o guia, o Palácio foi construído sobre um pequeno monte e, com isso, as árvores estão enraizadas no topo desse monte. 🤔

Depois da visita, fomos direto até o Dharohar Folk Dance, onde acontece diariamente, das 19h às 20h, um show de danças folclóricas. Chegamos antes das 18h (a bilheteria abria só às 18:15h), mas como previsto pelo guia, por conta do Holi, a procura estava alta e o show das 19h lotou. Por sorte, fizeram uma sessão extra às 20h e conseguimos comprar. Fica a dica que descobrimos no dia de que é possível comprar pela internet até as 16h. 😏

Com o ingresso em mãos, aproveitamos essa hora livre para ir pro hotel e tomar um banho. No caminho, fizemos uma rápida parada para apreciar o lindo pôr do sol às margens do Lago Pichola. Nos arrumamos rápido e logo retornamos para o local do show, que acontece dentro de um haveli, num pátio ao ar livre e deixa a experiência ainda mais legal. Foi uma hora de muita dança, cor e música local

Saímos do show já por volta das 21:30h e estávamos bem cansados depois de um dia inteiro na rua. Paramos em um café (Grasswood Café), pedimos um sanduíche e uma salada e jantamos rapidinho para logo ir descansar.

No segundo dia por Udaipur tomamos um café com calma no hotel, curtindo a vista linda da cidade. Logo pela manhã já deu pra perceber uma energia diferente, todos felizes, arrumando a cidade para o Holi. Parecia nosso 31 de dezembro. Pegamos as bicicletas fornecidas pelo hotel e fomos pedalar pelo Lago Fateh Sagar, localizado a uns 2km do centro da cidade, distância suficiente para garantir uma pedalada bem tranquila e com pouco movimento. Sem falar no visual lindo do lago e dos arredores. Aliás, os lagos realmente dão um charme e um clima tranquilo a Udaipur e às vezes até parece que estamos em outro país.

Para recuperar as energias, fomos almoçar (Yummi Yoga) e por volta das 14h já voltamos pro hotel. O James ficou tocando seu ukulelê enquanto eu, pelas 16h fui “fazer a unha”. A experiência não foi lá essas coisas (longe de uma boa manicure brasileira), mas ao menos as mãos e pés ficaram de molho e ganharam uma massagem gostosa. 💅😊

Pelas 18h já saímos para nosso jantar especial de Holi. Nas ruas todos estavam arrumados, tudo bem agitado, uma energia linda! Parece que finalmente tivemos nosso Reveillon de 2019/2020 já que na Etiópia não tivemos uma comemoração de verdade no dia 31/12. 😁

Fomos jantar no Ambrai, um restaurante que fica à beira do Lago Pichola. Que vista linda!!! Por lá curtimos o pôr do sol e o lindo nascer da lua, além de uma comida deliciosa. 😋 Um jantar um pouco mais caro considerando o padrão que temos adotado na viagem, mas a ocasião pedia e a vista era realmente incrível! Udaipur, a Veneza do Oriente, o destino romântico do Rajastão, foi mesmo bem especial pra nós! 😍

Saímos de lá pelas 20:30h e já vimos algumas ‘fogueiras’ queimadas pelo caminho. Na praça principal de Udaipur, em frente ao templo Jagdish, o agito era grande. A história do Holi está relacionada a vitória do bem sobre o mal, uma tradição que, segundo os historiadores, antecede em muitos séculos o nascimento de Cristo.

A origem é atribuída a história do Rei Hiranyakashyap que, como soberano, exigia que toda a população subordinada a ele o adotesse como deus, e este deveria ser o único adorado por todos. Porém, nem seu filho Prahlad concordava com essa regra e frequentemente prestava tributos a Vishnu, um dos três deuses mais importantes do hinduísmo. Por conta disso, o rei ordenou sua irmã, Holika, que matasse o seu próprio filho. Como Holika tinha poderes sobrenaturais de resistir ao fogo, ela entrou em uma fogueira abraçada a Prahlad, seu sobrinho, que deveria morrer carbonizado. Mas os poderes de Vishnu, o deus que Prahlad tanto adorava, o protegeram do fogo e ainda anularam os poderes sobrenaturais de Holika, sua tia, que morreu carbonizada.

Além de comemorar a vitória do bem sobre o mal, as festividades do Holi também estão relacionadas à chegada da primavera e sempre ocorrem em noite de lua cheia. As celebrações começam quando as fogueiras, espalhadas por toda a cidade são acendidas. O momento da queima é uma loucura com bombinhas e faísca pra todos os lados. Ficamos bem perto da principal fogueira de Udaipur e fomos pegos de surpresa pelas explosões e o tumulto, mas fora o susto, a celebração foi muito bonita. 😅

No dia que sucede a queima de Holika é que o Holi realmente se torna o festival das cores. Nesse dia a festa é pela manhã, quando as ruas são tomadas por pessoas de todas as idades, que se divertem com arminhas, balões e baldes de água e muito pó colorido. A tradição das cores vai além de uma brincadeira. A mensagem que se pretende passar é que, por trás das aparências, classes sociais e castas (no caso da Índia), na essência, somos todos iguais. Somos todos seres humanos e devemos respeitar as diferenças. E realmente é tanto pó e água que ficamos quase irreconhecíveis. 🌈😊

Sabendo da tradição, colocamos as roupas mais velhas e, antes mesmo de sair do hotel, o pessoal da recepção já nos desejou um happy Holi e pintou nosso rosto. Caminhamos até a praça principal, onde celebramos a queima de Holika no dia anterior e por lá tudo era festa! Todos passando pó colorido uns nos outros, crianças se divertindo com suas arminhas e balões de água. Além da festa na rua, fomos conferir as comemorações dentro do templo também, de onde ecoavam lindos cantos festivos, além de muito alegria e pó colorido, é claro! As fotos dizem mais que as palavras! 😅

No fim da manhã, voltamos pro hotel e tomamos um bom banho, mas durante uma semana os resquícios do Holi ainda coloriram partes do nosso corpo 😂😂😂. Almoçamos no restaurante do hotel e ficamos o resto do dia por lá. Como nossa noite seria dentro de um ônibus, sair na rua em pleno Holi sabendo que não teríamos mais banho naquele dia era muito arriscado. Do terraço do nosso hotel, o Madri Haveli, curtimos nossas últimas horas em Udaipur, que foi um destino super especial – e muito colorido. 😁🌈

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